19 janeiro 2008

O drama da chuva e a ilusão de óptica

2007 foi mais um ano em que não choveu na ilha. Mete dó a reportagem do jornalista João Almeida Medina sobre a situação dos criadores de gado no concelho do Porto Novo, publicada na edição nº 825 do A Semana, de 30 de Novembro.
Mas, esta contou-me o meu irmão e não me contive em risos:

Dizia-me que há alguns anos um jovem das Figueiras – uma das localidades mais encravadas do concelho da Ribeira Grande - lhe contara das dificuldades que ele e sua família tiveram que enfrentar em mais um ano de seca na ilha. A chuva não veio, os campos permaneciam ressequidos e o pouco pasto que ainda se podia encontrar estava tão tostado que as cabras negavam a comê-lo. Por mais que as alimárias tivessem fome não se mostravam dispostas a meter a focinheira no pasto, isto num claro desafio à máxima local segundo a qual “burro que tem fome ta cmê até córd”
Todo aquele que, na localidade, tivesse uma cabrinha estava desanimado porque nenhuma das criaturas dava sinais de querer suspender a “greve de fome”. Nem um pingo de leite para enganar o café preto as famílias conseguiam, já que as cabras, outrora leiteiras, estavam moribundas. Então, desesperado, que resolve fazer um dos moradores?
Arranja um punhado de garrafas verdes (daquelas que trazem vinho Tinto), corta-as em forma circular e com ares de arame fabrica alguns pares de óculos, bem especiais. Colocou um par nos olhos de cada cabra e não é que os bichos começam a devorar o pasto? Pois é, as cabras, coitadas, levadas pela ilusão de óptica, pensavam que a palha estava verde e devoravam tudo que lhes aparecessem pela frente. A partir daí começaram a restabelecer as parcas forças e até ressurgiu aquele pinguinho de leite para enganar o café.
Afinal, as cabras não só nos ensinaram a comer pedras como também nos obrigaram a fabricar óculos… especiais.

Pois, é o hábito tipicamente crioulo de brincar com a própria desgraça.

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